O sonho da casa própria, ou o investimento em um lote, nem sempre segue o caminho planejado. Situações inesperadas podem levar à necessidade de desfazer um negócio imobiliário, um processo conhecido como distrato. Se você está enfrentando ou prevê a rescisão de um contrato de compra e venda de imóvel ou lote, a Lei nº 13.786/2018, popularmente conhecida como Lei dos Distratos Imobiliários, é a sua principal referência.
Esta legislação foi criada para trazer clareza e segurança jurídica a um cenário que, antes, era marcado por incertezas e litígios. Ela estabelece as regras para a rescisão de contratos por inadimplemento ou desistência do comprador, bem como as consequências para a incorporadora ou loteadora em caso de atraso na entrega.
Se você busca entender seus direitos e deveres ao desfazer um contrato imobiliário, este artigo é essencial.
Vamos desmistificar a Lei 13.786/2018, traduzindo seus termos para uma linguagem simples e direta, para que você possa navegar por esse processo com confiança e conhecimento. Compreenda as penalidades, os prazos de devolução de valores e as nuances que impactam diretamente quem precisa rescindir um contrato de imóvel ou lote.
O Quadro-Resumo: Sua Primeira Proteção em Caso de Distrato

A Lei dos Distratos, Lei nº 13.786/2018, trouxe uma inovação fundamental para a segurança jurídica dos contratos imobiliários: a obrigatoriedade do quadro-resumo. Este documento, que deve iniciar todo contrato de compra e venda, promessa de compra e venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas (seja em incorporações imobiliárias ou loteamentos), serve como um guia transparente das condições do negócio. Para quem está pensando em um distrato, ou já está passando por ele, o quadro-resumo é a primeira linha de defesa.
Por que o Quadro-Resumo é Crucial para o Distrato?
O grande diferencial do quadro-resumo, sob a ótica do distrato, é a exigência de que ele contenha, de forma clara e destacada, as consequências do desfazimento do contrato.
Isso inclui as penalidades aplicáveis e os prazos para devolução de valores ao adquirente, seja por meio de distrato amigável ou por resolução contratual motivada por inadimplemento. Em outras palavras, antes mesmo de assinar o contrato, você já deve ter ciência das regras do jogo caso a rescisão se torne necessária.
Principais informações do quadro-resumo relevantes para o distrato:
- Preço total do imóvel e condições de pagamento: Essencial para calcular os valores pagos e as bases para futuras restituições.
- Valor da comissão de corretagem: Sua integralidade pode ser deduzida em caso de distrato por culpa do comprador.
- Índices de correção monetária: Utilizados para atualizar os valores a serem restituídos.
- Consequências do desfazimento do contrato: Este é o ponto-chave. A lei exige que as penalidades e os prazos de devolução de valores sejam apresentados com destaque negritado. Isso garante que o comprador não seja pego de surpresa pelas retenções ou pela demora na restituição.
- Direito de arrependimento: Informações sobre o prazo de 7 dias para desistência, especialmente para contratos firmados fora do estabelecimento comercial. Exercer esse direito dentro do prazo implica na devolução integral dos valores, sem penalidades.
Omissões no Quadro-Resumo e o Direito à Rescisão
Uma das maiores proteções que o quadro-resumo oferece é a possibilidade de rescisão contratual sem penalidades ao adquirente caso haja omissão de informações essenciais. Se o incorporador ou loteador não sanar a omissão em até 30 dias após a notificação do comprador, essa falha caracteriza justa causa para a rescisão do contrato.
Nesses casos, o comprador tem o direito à devolução integral dos valores pagos, sem as deduções que seriam aplicadas em um distrato por sua própria desistência.
Além disso, a lei exige que as cláusulas sobre distrato ou suas consequências sejam aceitas expressamente pelo comprador, com assinatura destacada. Essa medida reforça a transparência e minimiza conflitos futuros, garantindo que o comprador esteja plenamente ciente das condições de rescisão desde o início do vínculo contratual.
Atraso na Entrega e o Distrato: Seus Direitos Diante da Mora da Construtora

Um dos motivos mais comuns para o desfazimento de um contrato imobiliário é o atraso na entrega do imóvel ou da infraestrutura do loteamento. A Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018) estabeleceu regras claras para essa situação, protegendo o comprador que se vê prejudicado pela mora da incorporadora ou loteadora.
O Prazo de Tolerância e Suas Implicações no Distrato
A lei permite que o contrato preveja uma cláusula de tolerância de até 180 (cento e oitenta) dias corridos para a entrega do empreendimento, além da data inicialmente estipulada. É crucial que essa cláusula esteja expressamente pactuada, de forma clara e destacada no contrato. Durante esse período de 180 dias, a construtora não é considerada em atraso, e o comprador não tem direito a indenização ou à rescisão do contrato por esse motivo.
O que Acontece se o Atraso Ultrapassar a Tolerância?
Se a entrega do imóvel ou da infraestrutura do loteamento exceder os 180 dias de tolerância, e o atraso não for culpa do comprador, a Lei 13.786/2018 oferece duas opções fundamentais para quem busca o distrato ou a compensação:
1.Rescisão do Contrato (Distrato por Culpa da Construtora): O comprador adquire o direito de rescindir o contrato e receber a devolução integral e atualizada de todos os valores pagos, incluindo a comissão de corretagem. Essa restituição deve ser efetuada em até 60 (sessenta) dias corridos a partir da data da resolução. Além disso, pode haver a aplicação de multa contratual em favor do comprador, se prevista, ou por inversão da cláusula penal, conforme entendimento jurisprudencial. Este é o cenário mais favorável para o comprador que deseja o desfazimento do negócio devido ao atraso.
2.Manutenção do Contrato com Indenização: Caso o comprador opte por não rescindir o contrato e aguardar a entrega, ele terá direito a uma indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora ou loteadora, por mês de atraso, calculada pro rata die (proporcionalmente aos dias). Essa multa incide a partir do primeiro dia após o fim do prazo de tolerância até a efetiva entrega das chaves ou da unidade/lote. O pagamento dessa indenização ocorre na entrega do imóvel, com a devida atualização monetária. Embora não seja um distrato, essa opção visa compensar o comprador pelo prejuízo do atraso.
É fundamental destacar que essas regras se aplicam tanto a incorporações imobiliárias (apartamentos) quanto a loteamentos. Mesmo que a compra seja financiada, se o atraso for culpa da incorporadora, as opções de rescisão com devolução integral ou manutenção com multa de 1% ao mês permanecem válidas para o comprador.
Conhecer esses direitos é essencial para quem busca o distrato ou a compensação justa diante de um atraso na entrega.
Distrato pelo Comprador: Retenções e Prazos de Devolução na Compra de Imóvel na Planta

Quando a decisão de desfazer o contrato de compra e venda de um imóvel parte do próprio comprador – seja por desistência ou por inadimplemento de suas obrigações –, a Lei dos Distratos (Lei nº 13.786/2018) estabelece as regras para a restituição dos valores pagos e as deduções que a incorporadora pode realizar. É um ponto crucial para quem está passando por um distrato, pois define o montante a ser recebido de volta e o prazo para isso.
Quais Valores Podem Ser Retidos pela Incorporadora?
Em um distrato por culpa do adquirente, a incorporadora tem o direito de reter alguns valores, que são deduzidos do montante total pago pelo comprador. As principais deduções são:
Comissão de corretagem: A integralidade da comissão de corretagem, que geralmente é paga no início do negócio, pode ser retida.
Pena convencional (multa): A lei permite a retenção de até 25% da quantia paga pelo comprador. Contudo, se o empreendimento estiver sob o regime de patrimônio de afetação (um mecanismo legal que segrega o patrimônio da obra do patrimônio da incorporadora, oferecendo maior segurança aos compradores), a multa pode chegar a 50% da quantia paga. Essa diferença visa proteger o fluxo de caixa da obra até sua conclusão.
Além dessas deduções, o comprador também pode ser responsabilizado por outros custos, como:
- Impostos reais incidentes sobre o imóvel durante o período em que o contrato esteve vigente.
- Cotas de condomínio e contribuições devidas a associações de moradores, se houver.
- Valor de fruição do imóvel: Equivalente a 0,5% sobre o valor atualizado do contrato, por mês, calculado pro rata die. Este valor é devido se o comprador teve a posse ou a disponibilidade do imóvel, mesmo que não o tenha ocupado efetivamente. É importante notar que a fruição é a única dedução que pode, em tese, ultrapassar o valor efetivamente pago pelo comprador, caso o período de posse seja muito longo.
- Demais encargos e despesas previstas em contrato.
É fundamental que o comprador esteja ciente de que, com exceção da fruição, o total das deduções e retenções não pode ultrapassar o valor que ele já pagou à incorporadora. Isso significa que a incorporadora não pode cobrar valores adicionais além do que já foi recebido, exceto pela fruição.
Prazos para a Restituição dos Valores
Os prazos para a incorporadora efetuar a devolução dos valores ao comprador variam conforme a modalidade do empreendimento:
Com patrimônio de afetação: A restituição deve ocorrer em até 30 (trinta) dias após a emissão do “habite-se” ou documento equivalente da obra.
Sem patrimônio de afetação: A devolução será realizada em parcela única, no prazo de até 180 (cento e oitenta) dias contados da data do desfazimento do contrato.
Em caso de revenda da unidade: Se a incorporadora conseguir revender a unidade antes dos prazos acima, o valor devido ao comprador original deverá ser pago em até 30 (trinta) dias após a nova venda, com a devida atualização monetária.
Lembrando que esses prazos podem variar em distratos judiciais, pois, nesse caso, a decisão não depende apenas do comprador e do vendedor, mas também da avaliação do juiz responsável pelo processo.
Quer entender em detalhes como funciona o distrato de um imóvel na planta e quais direitos você pode assegurar? Acesse nosso artigo completo e saiba tudo sobre o assunto:
Cancelamento da Compra de Imóvel na Planta através do Distrato Imobiliário: Guia Completo
Distrato e Alienação Fiduciária: Uma Distinção Crucial
É vital compreender que as regras de distrato acima se aplicam a contratos celebrados exclusivamente com o incorporador. Quando o imóvel é adquirido por meio de financiamento com alienação fiduciária (onde o imóvel é dado como garantia ao banco), a situação muda drasticamente.
Nesses casos, a Lei do Distrato não se aplica diretamente para a rescisão por inadimplemento do comprador. A restituição seguirá a lei específica da alienação fiduciária (Lei nº 9.514/1997), que geralmente prevê a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário e a realização de leilão para a venda do imóvel. O comprador, nesse cenário, deve buscar primeiramente o cancelamento do financiamento junto ao banco.
No entanto, se o desfazimento do contrato for motivado por culpa da incorporadora (por exemplo, atraso na entrega da obra), mesmo havendo alienação fiduciária, as opções de rescisão com devolução integral ou manutenção com multa de 1% ao mês (conforme Art. 43-A da Lei 13.786/2018) permanecem válidas para o comprador.
Essa distinção é fundamental para quem busca o distrato, pois as consequências financeiras e jurídicas são bastante diferentes dependendo da modalidade do contrato e da parte que deu causa à rescisão.
Distrato de Loteamento: Regras Específicas para a Rescisão de Contratos de Lotes

O desfazimento de contratos de aquisição de lotes, embora similar ao de imóveis em incorporação, possui suas particularidades sob a Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018), que alterou a Lei nº 6.766/1979 (Lei de Loteamentos). Para quem busca o distrato de um lote, é essencial conhecer as regras específicas de retenção e devolução de valores.
Deduções em Caso de Distrato de Loteamento
Quando o distrato de um contrato de loteamento ocorre por iniciativa do adquirente, os valores pagos serão restituídos, atualizados, mas com a possibilidade de as seguintes deduções por parte do loteador:
- Fruição do lote: Pode ser retido um valor correspondente a até 0,75% ao mês sobre o valor atualizado do contrato, calculado desde a data da posse do lote pelo comprador até a sua efetiva devolução ao loteador. No entanto, na prática, essa dedução raramente é significativa, uma vez que, em lotes, geralmente não há muito a ser usufruído.
- Cláusula penal e despesas administrativas: A soma da cláusula penal (multa) e das despesas administrativas está limitada a 10% do valor atualizado do contrato. Essa limitação visa evitar abusos e garantir que a retenção seja proporcional aos custos administrativos do loteador.
- Encargos moratórios: Valores referentes a prestações em atraso, se houver.
- Tributos, contribuições associativas/condominiais e tarifas: Quaisquer impostos, taxas ou contribuições devidas sobre o lote durante o período em que o comprador esteve vinculado ao contrato.
- Comissão de corretagem: Se a comissão de corretagem foi integrada ao preço do lote e paga pelo comprador, sua integralidade pode ser retida pelo loteador.
É importante ressaltar que, assim como nos contratos de incorporação, o total das deduções (exceto a fruição) não pode ultrapassar o valor efetivamente pago pelo adquirente. A lei busca um equilíbrio para compensar o loteador pelos custos e prejuízos decorrentes do desfazimento, sem onerar excessivamente o comprador.
Prazos para a Devolução dos Valores em Loteamentos
Uma diferença importante no distrato de loteamentos é o prazo para a restituição dos valores. A devolução pode ser parcelada em até 12 parcelas mensais, com a primeira parcela vencendo em até 12 meses após a data da rescisão do contrato.
Essa flexibilidade no prazo de devolução é uma particularidade dos loteamentos, visando adequar-se à dinâmica de vendas e desenvolvimento desses empreendimentos, que muitas vezes envolvem investimentos de longo prazo em infraestrutura.
Direito de Arrependimento no Distrato de Loteamento
O direito de arrependimento de 7 dias, previsto no Código de Defesa do Consumidor e reforçado pela Lei do Distrato, também se aplica aos contratos de loteamento. Se o contrato foi firmado em estandes de vendas ou fora da sede do loteador, o comprador tem um prazo de 7 dias para desistir do negócio, mediante comunicação formal.
Exercer esse direito dentro do prazo implica na devolução integral de todos os valores pagos, incluindo a comissão de corretagem, sem qualquer retenção ou penalidade. Essa é uma salvaguarda importante para o consumidor que, porventura, assine um contrato de forma impulsiva ou sem a devida reflexão.
Deseja conhecer todas as nuances do distrato de loteamento e como proteger seu investimento? Acesse nosso artigo completo e saiba tudo sobre o assunto:
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Registro de Incorporações Imobiliárias: Uma Camada de Segurança que Impacta o Distrato

Embora o registro das incorporações imobiliárias possa parecer um tema distante do distrato, a Lei dos Distratos (Lei nº 13.786/2018) reforçou a importância desse processo, e isso tem um impacto direto na segurança do consumidor e, consequentemente, nas situações que podem levar a um desfazimento de negócio.
O registro de uma incorporação exige que a incorporadora apresente uma série de documentos essenciais, como o título de propriedade do terreno, certidões negativas, projeto aprovado e o memorial descritivo do empreendimento.
Como o Registro Impacta o Distrato?
A Lei 13.786/2018, ao enfatizar a exigência do quadro-resumo (Art. 35-A) e permitir que o registro da incorporação seja impedido em caso de omissões relevantes, adicionou uma camada de proteção ao comprador.
Isso significa que, desde o início, as informações cruciais sobre o empreendimento devem ser transparentes e corretas. Para quem está considerando um distrato, ou já está nele, a existência de um registro completo e sem omissões pode:
- Reduzir a probabilidade de distratos por falha de informação: Um registro transparente e um quadro-resumo completo minimizam a chance de o comprador alegar desconhecimento de condições contratuais, o que poderia levar a um distrato por justa causa.
- Facilitar a resolução de conflitos: Com todas as informações devidamente registradas, há menos espaço para disputas sobre o que foi ou não acordado, tornando o processo de distrato mais objetivo e menos litigioso.
- Proteger o comprador contra fraudes: A exigência de documentação completa e a possibilidade de impedir o registro por omissões relevantes servem como um filtro contra empreendimentos irregulares, que poderiam gerar problemas futuros e, consequentemente, a necessidade de um distrato.
Em suma, a rigidez da Lei do Distrato quanto ao registro das incorporações e à completude do quadro-resumo atua como uma medida preventiva. Ela busca garantir que o comprador tenha acesso a todas as informações necessárias antes de firmar o contrato, reduzindo as chances de surpresas e, por extensão, de situações que levem ao desfazimento do negócio.
Para quem já está em um processo de distrato, a existência de um registro regular e de um quadro-resumo bem elaborado pode simplificar a análise dos direitos e deveres de ambas as partes.
Conclusão: Navegando pelo Distrato com Conhecimento e Segurança

A Lei nº 13.786/2018, a Lei do Distrato Imobiliário, é um divisor de águas para quem se depara com a necessidade de rescindir um contrato de compra e venda de imóvel ou lote. Longe de ser apenas um conjunto de artigos legais, ela é a bússola que orienta compradores e incorporadoras/loteadoras em um momento delicado, estabelecendo as regras do jogo para o desfazimento do negócio.
Para você que está passando ou vai passar por um distrato, compreender profundamente essa lei não é apenas uma vantagem, é uma necessidade.
Ela define as condições sob as quais você pode rescindir o contrato, as penalidades que podem ser aplicadas, os valores que você tem direito a receber de volta e os prazos para essa restituição. Seja por um atraso na entrega da obra, por uma mudança de planos ou por qualquer outro motivo que leve ao desfazimento, o conhecimento da Lei 13.786/2018 é a sua maior proteção.
Esteja atento aos detalhes do seu contrato, especialmente ao quadro-resumo, e saiba que a lei busca equilibrar os direitos e deveres de ambas as partes. Em situações de atraso da construtora, seus direitos são ampliados, permitindo a rescisão com devolução integral ou indenização.
Em caso de desistência, as retenções são limitadas e os prazos de devolução são definidos. A complexidade da alienação fiduciária, por sua vez, exige uma atenção redobrada e, muitas vezes, uma abordagem jurídica distinta.
Não permita que a falta de informação o coloque em desvantagem. Ao dominar os princípios da Lei do Distrato, você estará mais preparado para negociar, tomar decisões assertivas e, se necessário, buscar a justiça para garantir que seus direitos sejam plenamente respeitados.
O processo de distrato pode ser desafiador, mas com o conhecimento certo, você pode transformá-lo em um caminho mais seguro e justo. Sua segurança jurídica no mercado imobiliário começa com a informação!
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